terça-feira, 7 de julho de 2020

Quo Vadis. O Filme da nossa Vida...





Salazar, o jovem ministro das finanças que tomou posse em Abril de 1928, sob o comando dos militares da ditadura que fez cair a Primeira República, proferiu, no seu discurso de tomada de posse, uma frase lapidar que ditaria o rumo do país durante 40 anos, até à sua morte em 1968. Foi esse o tempo em que esteve no poder em Portugal como o senhor absoluto dos destinos desta nação que parece fadada a depender de homens providenciais.
Sei muito bem o que quero e para onde vou.

Teve Oliveira Salazar o condão de dizer uma coisa que os portugueses não estavam habituados a ouvir desde a Monarquia Constitucional e até 1928, pelo menos.

Tanto a Monarquia Constitucional como a Primeira República tiveram muitos homens que tentaram impor o que queriam, mas nenhum deles sabia muito bem para onde ia, ou, se sabia, desconhecia como lá chegar.


Porque é que a ditadura militar de Maio de 1926 se impôs tão facilmente ( pouco menos que um passeio a cavalo, de Braga a Lisboa, para Gomes da Costa, sem praticamente usar as armas ) e durou tanto tempo, mesmo que anos depois de eclodir se tenha transformado no que ficou conhecido como Estado Novo ? Porque ninguém, teve melhores argumentos ou força para a contrariar e porque havia de aparecer um designado homem providencial que disse saber o que queria e qual o caminho a seguir para tirar o país do lodo. Caso contrário o enorme PREC que foi o período da Monarquia Constitucional prolongado na Primeira República teria durado mais uns anos sem que se possa saber como tudo aquilo terminaria entretidos que andavam, os políticos e revolucionários, a ceifar oportunidades e vidas. Destas últimas tanto se abatiam as mais humildes como as de ilustres homens de grandes qualidades políticas, culturais e intelectuais.

Parece por isso estarmos destinados, nação e país, a esperar por que venha um homem providencial qualquer colocar as nossas esperanças alinhadas com um destino que, pelo menos, abra uma porta por onde se entreveja alguma hipótese de futuro.

E isso é um facto recorrente em vários períodos da nossa história. Talvez o caso mais conhecido e paradigmático seja, ainda até agora, o mais lembrado, porque, como noutros momentos, a independência de Portugal estava posta em causa: a espera pelo Desejado, e nunca regressado D. Sebastião. Acho que tantas foram as ocasiões em que estivemos nessa circunstância, a de deixarmos de ser um país, que sofremos hoje de um sebastianismo endémico; isto é, estamos sempre à espera de que algum homem providencial, aparecido como que por milagre, nos venha resgatar seja daquilo que for.


Em 1928, para a ditadura militar, Salazar seria o único homem capaz de dar ao país aquilo de que ele precisava depois de tantos anos de mortes, fome, guerra, doenças, miséria e endividamento externo num limite tal que nenhuma organização internacional, nenhum país, arriscaram emprestar a Portugal e, quando surgiu uma hipótese de isso acontecer, os custos eram tão altos e os sacrifícios a impor tão pesados que nenhum político de passagem pelo governo arriscou ousar comprometer-se, e ao país, com tais circunstâncias.

Os militares de 1926 agarraram-se a Salazar como última e única providência possível para operar o milagre de salvar Portugal. A verdade é que o país que este deixou a Marcelo Caetano, em 1968, era, para o bem e para o mal, totalmente diferente do que recebera quarenta anos antes. A duras penas os portugueses de então pagaram e sofreram essa recuperação económico-financeira que, apesar de tudo, e salvo algumas poucas excepções, não os retirou da pobreza endémica.

Os tempos que correm são diferentes, felizmente para melhor, apesar de tudo. Mas a Pandemia, como se adivinhava, destruiu um presente que, se não era grande coisa, pelo menos tinha aberto uma porta para entrever um futuro melhor do que aquele a que o governo Passista/Troikista nos tinha destinado. Seria Costa o tal providencial, condenados que estamos a depender sempre dessa figura do homem providencial, que iria operar a catarse que nos libertasse e projectasse para um lugar de tranquilidade colectiva ? ( claro que já não ousamos sequer sonhar sair da cauda da Europa... ) A Pandemia revelou que não! Costa é afinal mais equilibrista e malabarista do que "homem providencial".

Terminado o prazo de garantia da Geringonça, como todos os electrodomésticos que compramos para nossas casas, esta deu de imediato sinais de começar a ter problemas. E como acontece com quase todos os electrodomésticos que compramos, as avarias, findo o prazo de garantia, ficam-nos sempre mais caras na reparação do que a compra de um novo equipamento.

Depois, bem, depois vem sempre um conselheiro técnico dizer que o electrodoméstico, com um jeito aqui e outro ali, aguentar-se-à mais uns tempos e fará um figuraço. A questão é que raramente isso se confirma. E é aí que vem o pregador de milagres anunciar um milagre que nos levará a não termos que trocar a Geringonça em que o nosso electrodoméstico se tornou.

Digo-vos eu que não resulta, porque sei do que falo em matéria de electrodomésticos cá em casa. Se o prazo de garantia termina hoje, a partir de amanhã começo a esperar pelo dia próximo em que terei que o trocar.

Comprovadamente, a Pandemia estoirou com a Geringonça e, mais do que provavelmente, com a maioria absoluta que Costa achava que estava a construir. E nem qualquer milagre que Marcelo invente pode remediar isso, porque, como bem sabemos, os milagres de Marcelo são muito circunstanciais e não duram mais do que os poucos dias que demora um vírus impenitente e ateu a contrariar o melhor catolicismo que enche o peito de um presidente.

Para onde vamos afinal ?!
Bom, já nem Salazar, nem Centeno conseguirão dizer-nos. Só conseguimos saber onde está Salazar e para onde vai Centeno.

O que queremos ?!
Pois, acho que também não sabemos muito bem, mas para começo gostávamos de que não nos condenassem a andar a pagar, para o resto das nossas vidas, a TAP, o BES, o BPN, o Novo Banco, a EDP, a CGD, o BANIF, o BPP, a PT, as Rendas eternas das parcerias público-privadas, etc, etc, etc. E gostávamos também que os nossos pesados impostos servissem apenas para dotar o país das infra-estruturas necessárias e para investir naquelas onde desinvestiram durante tantos anos. Para revigorar o SNS, as polícias, e tantos outros serviços essenciais; para pagar melhor aos profissionais de saúde e aos polícias e não para irem parar aos bolsos de todos os plutocratas que têm usado o estado para nos empobrecerem continuadamente. Há, já agora: se não for pedir muito acabem de vez com as mensagens que andam a enviar à população sobre o controlo da Pandemia. Mas que controlo ? Podemos não saber para onde nos levam, mas não somos parvos de todo para nem sequer sabermos onde estamos !

Mas quem pode fazer isto tudo ? Pois, com o histórico que temos, provavelmente só um homem providencial já que de pregadores milagreiros , equilibristas e malabaristas estamos servidos. E que esse tal homem providencial não fique muito tempo no governo pois só isso nos garantirá que não terá tempo de descobrir onde levam todos os corredores dos palácios do poder, que é o que muitos ministros, primeiros ministros, secretários de estado e quejandos, plutocratas, enfim, vêem como missão de vida na sua passagem por qualquer governo.
Portugal e a vida dos portugueses...?!?   Isso são meros colaterais.

Jacinto Lourenço