quarta-feira, 28 de outubro de 2020

Não Vou por Aí...

 


"Porque nele vivemos, e nos movemos, e existimos, como também alguns dos vossos poetas disseram: Pois somos também sua geração." (Actos 17:28)


Ao reflectir um pouco sobre o verso bíblico citado acima ocorreu-me a realidade de tanta gente a quem a melhor ideia que lhes ocorre, para fazer a aplicação prática desta pequena quantidade da Escritura,  é no grande púlpito das redes sociais e em particular o FB. Ou seja, vivem nele, movem-se por ele e só existem em função dele, do FB. O seu 'cristianismo', o  desta geração de cristãos Facebookianos, encontrou um púlpito de onde pode ser pregado tudo o que quiserem, como entenderem e quando desejarem. Não precisam de filtros, pelo menos no imediato, e têm até a prerrogativa do envio de mensagens endereçadas e supostamente encriptadas. Acham que os destinatários saberão desencriptá-las não correndo eles o risco de poder ser considerada uma eventual descortesia ao identificarem claramente quem pretende atingir. Ou seja, querem viver de bem com Deus e com o diabo.                                

  Dão-se como exemplo de tudo a todos. Ao lê-los percebemos que parecem conquistadores de céus e terra. Brandem a sua nova fé, qual tocha que incendeia a pira duma inquisição privada, como arma de arremesso contra os condenados, no altar da sua justiça, ao lago de fogo . 


Ao apresentarem-se, qualquer incauto os teria como se fossem encarnação viva de Abraão, Moisés, Jacob, Isaías, Jeremias ou qualquer outro profeta ou apóstolo. Quais Saulo de Tarso não admitem desafios à sua moralidade, à sua sublime e puríssima ética religiosa conquistada a duras penas ao exército de likes, risonhos e outros emójis dos seus seguidores.                                                              

  Trespassam e derrotam, com a sua palavra inspirada por grandes pregadores facebookianos tomados como verdadeiras inspirações, fontes de luz sempre acesas para eles. Têm revelações, proferem imprecações e determinam, por todas as pragas do Egipto, derrotas aos inimigos que pela sua frente quiserem impedir tamanha obra e tão grande ministério que é o seu.                        

  São bispos, pastores, apóstolos, evangelistas, professores, pregadores, conselheiros, discípulos, doutrinadores, doutores de uma e outra qualquer lei feita por medida, à sua medida, claro.                                                                                                                                                        

  Poucos títulos ou dons de operações extraordinárias lhes escapam. As casas de oração, as igrejas,  são demasiadamente acanhadas para a dimensão de tamanhos profetas desta desgraça !   Têm o cepro do poder facebookiano. Podem julgar e condenar tudo e todos, em especial os que não pensam, não agem ou não seguem o mesmo caminho deste 'cristianismo' made by FB, ou que porventura não lhes outorgam likes fofinhos, risonhos, dedos de aprovação e apoio.                                                                                                                                            

  Este é um peditório para o qual nunca dei e nunca virei a dar. Não se pode  reconhecer respaldo bíblico a gente desta, porque ele não existe. Por este andar, um dia destes ainda se arranjará pelo FB uma licenciatura em "ciências das religiões Facebookianas" . E um mestrado e um doutoramento, com muitos créditos, claro, para demorar menos tempo a pendurar o diploma no mural e que confirmará toda a 'sabedoria' de tantos doutos sabedores dos mistérios da nova visão religioso-místico-facebookiana. Nem Relvas ou Sócrates, ambos muito sábios, aliás, em matéria de títulos, teriam pensamentos tão arrojados.                  


Como José Régio vos diria:

[...] "Ide ! tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátrias, tendes tectos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios.
Eu tenho a minha Loucura! [...] 

Sei que não vou por aí."




Jacinto Lourenço - Outubro, 2020