quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

A Libertação do Mal - Como se Chegou até aqui ? (Parte 2)




      A História dos territórios e dos povos que na actualidade são identificados por Israel e Palestina é, como vimos, vasta e remonta a tempos perdidos  por entre os liames com que se foi tecendo a geografia humana naquela região. Não pretendo aqui revisitar essa História, mas convém talvez lembrar que a presença dos dois povos naquela região remonta a tempos que são descritos pelos primeiros livros da Bíblia. De Génesis ao livro de Zacarias, são inúmeras as referências à ocupação dos territórios quer pelos filisteus, quer pelos hebreus. Convém porém alertar os mais distraídos, em relação à História humana dos tempos pré clássicos e clássicos que os territórios que os telejornais das televisões nos fazem entrar todos os dias em casa, não pertenciam, como hoje  identificamos, apenas a dois povos. Na realidade territorial de que tanto falamos agora  e, para nos situarmos melhor, podemos ir à Bíblia, ou até, se quisermos, às «Antiguidades de Josefo» e constatamos que a pulverização de pequenas “cidades-estado” (não sendo este o melhor termo, servirá no entanto para percepcionar o que se pretende dizer) proliferavam, sendo que, à semelhança da Europa, cada pequeno Estado ou Reino não ocupava e dominava, muitas vezes, mais do que o território que ficava dentro das suas muralhas.

      Como referido no parágrafo anterior, podemos pegar numa Bíblia (embora a Bíblia não se limite a ser um livro de História, como bem sabemos) ou num qualquer livro de História antiga e ler acerca dos  povos e pequenos reinos que persistiam na região e onde coexistem hoje palestinianos e israelitas. Os primeiros ocupando Gaza e uma parte da Cisjordânia, e Israel no território definido pelas fronteiras traçadas à data da sua moderna independência em 1948, embora seja também potência ocupante e administrativa de uma parte da Cisjordânia. Nos textos bíblicos encontraremos escrito que, de um modo geral, em Gaza (embora não correspondendo exactamente aos actuais limites), por exemplo, existiam uma mão cheia de povos e reinos a que genericamente a Bíblia se refere por filisteus por terem tomado tal designação a partir da nomenclatura que foi atribuída pelos Romanos (o que é comummente aceite), embora o étimo possa, eventualmente, revelar também influência grega porventura na sequência do domínio grego na região - que é aliás anterior aos romanos.
      
      Quem conhece um pouco da História da Europa, por exemplo, sabe que até muito recentemente, cerca de um século e meio atrás, tanto a Itália como a Alemanha, (para dar um exemplo que eventualmente possa se mais conhecido de todos) não eram os países unificados que conhecemos na moderna geografia europeia mas sim territórios onde coabitavam pequenos Estados ou cidades-Estado. Na região do mundo em que nos focamos, haviam também algumas semelhanças com essa realidade.  

     No plano da dimensão territorial de que falamos, a do Médio Oriente, se lançarmos o olhar numa perspectiva literária e histórica, que é facilmente escrutinada por todos, através da Bíblia, constatamos, de facto, que eram muitos os pequenos reinos que ocupavam  grande parte do território, (embora entrecortados por alguns Impérios de génese local mais extensos e que foram surgindo ao longo da História, como por exemplo, e para citar apenas dois dos mais conhecidos, a Assíria e a Babilónia) sendo que, à semelhança da Europa, cada pequeno Estado não ocupava e dominava, muitas vezes, mais do que a linha de um horizonte  que o seu olhar alcançava e que se estendia aos campos que pretendiam tomar como seus mesmo que sem qualquer possibilidade prática de os conseguirem defender de ataques de exércitos inimigos que, em sucessivas vagas e razias saqueavam, destruíam sementeiras, matavam homens, mulheres e crianças para além de tomarem cativos para escravizar. Prática recorrente era também roubar rebanhos e arrasar e entulhar os poços de água, um bem que, como sabemos, é vital em qualquer parte do mundo, em qualquer tempo, mas muito mais no Médio Oriente daquele tempo e mesmo ainda na actualidade.

      Dos muitos povos e pequenos reinos que persistiam nos territórios a que se alude, um deles eram os Filisteus, que se concentravam numa faixa designada por “Philístia” ou Filisteia, como quisermos. A “Philístia” ou Filisteia, refere-se à terra que cinco diferentes princípes filisteus habitavam, e que é descrita em Josué no Cap.13:3, compreendendo o de Gaza, o de Asdode, o de Asquelom, o de Gate e o de Ecrom. Familiarizámo-nos com alguns destes nomes que persistem em cidades israelitas actuais e que andam agora nas bocas do mundo.                                     

      Para complementar, e compreender um pouco melhor o período milenar que abordamos, convém referir previamente que o termo «fronteira», como o conhecemos na actualidade, não era algo que fosse reconhecido por quem quer que fosse por esse tempo.  As eventuais «fronteiras» eram mais do que frágeis, eram absolutamente voláteis e à mercê de quem quisesse conquistar território, povoado, na maior parte dos casos apenas por pastores e rebanhos. Os métodos bárbaros para essa conquista não conheciam limites e quase todos se enquadravam no termo que usamos hoje para definir uma guerra bárbara que ultrapasse tudo o que diga respeito aos princípios mais básicos que devem reger a humanidade, mesmo que seja em guerra.                                                                                                                                    Mas é  aqui que voltamos ao fio da História e de como ele nos conduz até à designação de «Palestina» que, por muito que se pretenda e o reivindiquem aqueles que tomam partido contra Israel no momento actual, não designa  um país, uma entidade política ou uma nação que tenham correspondência com um território, balizado por fronteiras definidas, como as denominamos no tempo presente. A designação «Palestina» aparece tardiamente, no plano da História antiga, já no tempo do domínio romano e deriva da transliteração do termo «Philístia» ou, se quisermos «Filisteia», como já vimos mais acima neste texto. Ou seja: um território (referimo-nos para já, apenas a Gaza) habitado por vários povos debaixo da designação de «filisteus», como o designa a Bíblia, por habitarem na Filisteia, e que, curiosamente, consta na Bíblia como a ser incluído na Canaã mais alargada que foi prometida por Deus a Abraão.   

 (continua)

  

Jacinto Lourenço

Dezembro, 2023



segunda-feira, 4 de dezembro de 2023

A Libertação do Mal - parte 1

      



E de repente, como que despertando de um sono letárgico, a humanidade, em zonas críticas do globo, assiste a terríveis desenvolvimentos de confrontações que a levaram a experimentar destruição e morte em larga escala. A Rússia, retomando o fio condutor do pior que sempre teve dentro de si, invade e espezinha um país soberano vizinho, levando o caos a uma nação que tacteava ainda os novos caminhos que levam à democracia. Por seu turno, o grupo terrorista Hamas invade outro país soberano e desencadeia uma acção de larga escala assassinando, de um só golpe, cerca de 1500 cidadãos israelitas, entre homens, mulheres e crianças (algumas ainda bébés) tomando também como reféns mais de duas centenas de pessoas de várias nacionalidades mas onde a maioria é israelita.

Hoje, quando rabisco estas linhas, rompeu-se (ao que parece por iniciativa do Hamas, segundo a comunicação social) a trégua humanitária que permitiu que fossem, durante poucos dias, trocados reféns por prisioneiros palestinianos de prisões na Cisjordânea.
Em resumo: a Rússia, que nunca viveu realmente em democracia, depois de corroída por dentro e abatida com estrondo a terrível ditadura comunista, voltou ao seu velho estilo imperialista e expansionista revisitando a ambição czarista de erguer um novo império com o criminoso Putin à cabeça rodeado da seita de corruptos que constituem a sua entourage.
Focamo-nos nestes dois campos de explosão do mal no mundo e, se não podemos deixar de pensar nos actores que os alimentam, não devemos obliterar os que os toleram, seja por interesse directo, lateral ou colateral, e que na penumbra de gabinetes bafientos vão traçando planos para resultados que lhes sejam o mais favoráveis possível. Também eles, vendendo a alma ao diabo, engordam o número dos que escancaram as portas do inferno para a Libertação do mal que se abate sobre a humanidade.
Julgo não ser novidade para ninguém que existe uma tríade de actores primários e secundários que intervêm, por esta altura, na agressão que a Rússia move à Ucrânia. Desde logo a Rússia, claro. Depois os regimes maléficos da Bielorússia, do Irão e da Coreia do Norte (sendo a Bielorússia o grande facilitador da agressão e os dois últimos os municiadores de larga escala de armamento à Rússia), a que se juntam ainda, num apoio que podemos apelidar de (i)moral, quase todos os regimes comunistas que restam espalhados pelo globo e ainda os partidos comunistas existentes no mundo ocidental, quais Cavalos de Tróia dentro das democracias ocidentais. Não devemos também descartar, neste último grupo, dois outros "Cavalos de Tróia": a Turquia na NATO (embora sem um passado comunista ou mesmo de grande amizade pela velha Rússia comunista), e a Hungria na UE e na NATO. Todos estes actores, cada um à sua maneira, ou decidiram não renegar poder retirar alguns cínicos benefícios da guerra Rússia x Ucrânia, ou optaram por jamais virem a alijar a velha "mãe" Rússia soviética de dentro de si, mesmo que ela já tenha deitado para o seu caixote do lixo essa parte da sua história em troca de algo que não é pior nem melhor; simplesmente partilha, num plano diferente, a mesma raíz do mal do comunismo do período soviético.


Jac.Lourenço

Dezembro 2023