A temática da escravatura
é das que mais tenho lido e estudado em História ao longo da minha vida. Sempre procurei compreender o que pode estar oculto no coração e na cabeça de quem a tal prática se dedicou, ou continua ainda a dedicar-se, e das motivações sociais que permitiram o aparecimento e manutenção da monstruosidade do que considero ser o maior crime contra a humanidade desde o início da criação do mundo.
Quando chegou à altura de elaborar e submeter o meu projecto de dissertação de mestrado em História do Império Português, a minha escolha pareceu-me óbvia e centrou-se à volta da demografia da escravatura.
A escravatura é um facto histórico bastante bem documentado sendo relativamente fácil, a qualquer historiador, ou mesmo para alguém dotado do mais básico senso comum, chegar a uma conclusão: a realidade sobre esta, ao longo dos séculos, supera quase sempre o que alguma vez pudéssemos ter imaginado que poderia acontecer, tal a dimensão de tão grande tragédia e drama da humanidade. A escravatura é uma camada lodosa, grossa, escura, fétida e profunda que se depositou nos interstícios da alma humana e por lá teima em persistir ficar.
Quando chegou à altura de elaborar e submeter o meu projecto de dissertação de mestrado em História do Império Português, a minha escolha pareceu-me óbvia e centrou-se à volta da demografia da escravatura.
A escravatura é um facto histórico bastante bem documentado sendo relativamente fácil, a qualquer historiador, ou mesmo para alguém dotado do mais básico senso comum, chegar a uma conclusão: a realidade sobre esta, ao longo dos séculos, supera quase sempre o que alguma vez pudéssemos ter imaginado que poderia acontecer, tal a dimensão de tão grande tragédia e drama da humanidade. A escravatura é uma camada lodosa, grossa, escura, fétida e profunda que se depositou nos interstícios da alma humana e por lá teima em persistir ficar.
A RTP 1 está a passar um conjunto de quatro
documentários, intitulados genericamente “As Rotas da Escravatura”, que, mesmo tratando o assunto pela sua rama, tem o mérito de trazer ao grande público, em pinceladas largas, mas de cores fortes, o que este deve saber, no mínimo,
sobre o que foi, o que é, e o que
continuará a ser a escravatura. Não sei se alguma vez este cancro virá a ser
erradicado no mundo tal qual o conhecemos e perspectivamos que as próximas
gerações possam vir a conhecer.
Desenganem-se aqueles que
acham que a escravatura, ou o tráfico de pessoas destinadas a esse fim atingiu apenas os seres humanos de raça negra. Muito longe disso. Havia de decorrer muito tempo até que o
primeiro negro fosse escravizado, pois a escravatura e o tráfico foram, durante muitos séculos, dirigidos primariamente a gente de pele branca. Ironicamente, se podemos dizer alguma coisa
menos conhecida sobre a escravatura e o tráfico de seres humanos a ela destinado, é que tais práticas raramente foram dominadas por ideias racistas. A razão e valor
maior para traficar e escravizar um ser humano radicou, e radica ainda, principalmente, na questão económica.
Também não trarei,
decerto, nenhuma novidade se adiantar que quase nenhum povo ou raça, de
qualquer língua ou nação, pode dizer que não teve a sua quota parte de participação
na tragédia hedionda da escravatura.
Já agora será conveniente
acrescentar que os portugueses, não estando, nem de longe nem de perto, isentos
de grandes responsabilidades no tráfico
e na escravatura, só tardiamente aderiram a tais práticas, embora da forma,
quanto a mim, mais odiosa que se pode
imaginar e que passava, nomeadamente, entre outros, pelo método de razia nas costas africanas
para apresamento e tráfico continuado de homens mulheres e crianças. Quando o Papa Nicolau V outorga a D. Afonso
V, através da Bula
Dum Diversas, em Junho de 1452, o direito de submeter e subjugar as terras
dos infiéis,
abriu, para os portugueses, uma caixa de Pandora de onde saiu a
validação das miseráveis práticas da captura e redução à escravidão de todos os africanos a que conseguissem deitar mão, mesmo que, acrescente-se, tal
Bula só tenha vindo a “legitimar” algo a
que os portugueses se dedicavam já desde meados do século XV.
Jacinto Lourenço - Janeiro 2019